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As alianças e os planos de Bolsonaro, o candidato a presidente que obteve 46% dos votos válidos

As alianças e os planos de Bolsonaro, o candidato a presidente que obteve 46% dos votos válidos

Uma semana antes de ser atingido por uma facada na barriga, em 6 de setembro, o candidato do PSL à Presidência, Jair Bolsonaro, e seu filho Eduardo — reeleito deputado, com a maior votação do país — foram recebidos para um almoço numa esplêndida cobertura com vista de 360 graus para o duro skyline de São Paulo. Ali, no centro financeiro da capital, fica o escritório do empresário Mario Garnero, talvez o personagem que melhor transitou entre governos de esquerda, de direita, de centro, militares e civis, no Brasil e no exterior, nas últimas cinco décadas. Dono da Brasilinvest, foi Garnero quem apresentou o então coordenador da campanha de Lula, José Dirceu, ao então presidente americano, George W. Bush — o que foi entendido como o primeiro movimento “amansa elites” contra a temida “onda vermelha” na eleição de 2003 e que teve como fecho de ouro a Carta aos Brasileiros, suave conversão petista aos valores capitalistas.

No almoço na Brasilinvest, Bolsonaro e seu filho impressionaram Garnero, cujos negócios incluem intermediar transações comerciais e investir em novos empreendimentos. A amigos, ele disse ter tido boa impressão do jeito simples e direto do capitão — que o fazia se lembrar de Lula — e do compromisso que ele parecia ter com o Brasil. Na ocasião, além de falar sobre uma aproximação, em curso, com os Estados Unidos — no que Garnero já está ajudando —, o grupo também conversou sobre a ideia de revitalizar o Projeto Rondon no país. Lançado em 1967, durante o governo militar, visava levar jovens estudantes para lugares remotos no interior do país para ajudar a população carente. Relançado por Lula em 2003, ele anda esquecido. Bolsonaro disse que dará prioridade máxima à revitalização. Entre uma garfada e outra, alguém chegou a mencionar o nome do príncipe Luiz Philippe de Orléans e Bragança, recém-eleito deputado, como uma boa opção para o Ministério das Relações Exteriores. E, de lá para cá, tem circulado como boato também o de Álvaro Garnero, filho do empresário, para ocupar a pasta do Turismo, que deve ser incorporada à do Esporte e à da Cultura.

A aproximação com a Rede Record também foi tema da conversa. Coube aos Garneros fazer a ponte de Bolsonaro com Douglas Tavolaro, vice-presidente da Rede Record. Além de apresentar um programa de turismo na emissora, Álvaro Garnero é amigo próximo de Eduardo Bolsonaro, com quem fala semanalmente. Os Garneros já haviam colocado dinheiro na produção do filme sobre a vida de Edir Macedo. Depois disso, o programa foi para o horário nobre da TV. Na semana da eleição, o apoio declarado do bispo Edir Macedo, da Igreja Universal e dono da emissora, foi considerado decisivo para a virada de votos favoráveis ao candidato do PSL.

Perguntado sobre os planos da Record com Bolsonaro, Mario Garnero desconversa. “Foi uma apresentação informal. Não há nada planejado nem combinado”, disse por meio de um interlocutor.

Na quarta-feira, com a divulgação da primeira pesquisa do segundo turno, o alvoroço em torno de Bolsonaro aumentou. De acordo com o Datafolha, Bolsonaro tem 58% dos votos válidos em comparação a 42% de Fernando Haddad (PT). O favoritismo, desenhado no primeiro turno, fortaleceu-se na primeira semana de campanha. Assessores do candidato redobraram as reuniões para discutir ministeriáveis, projetos e alianças. Houve até quem tenha buscado integrantes do governo Temer já pensando em transição.

Em Brasília, o general Augusto Heleno, de quatro estrelas, posto máximo na hierarquia do Exército, articula a formação do ministério em um eventual governo Bolsonaro. Um grupo de generais da reserva se reúne para produzir documentos para colaborar com o governo. Dali vão sair de dois a três ministros, disse na quarta-feira um integrante da equipe de campanha. O próprio general Heleno é cotado para o Ministério da Defesa. O general de divisão Aléssio Ribeiro Souto, para Ciência e Tecnologia. O general Oswaldo de Jesus Ferreira, para Infraestrutura. Onyx Lorenzoni ganha tamanho como potencial ministro da Casa Civil. O astronauta Marcos Pontes e o engenheiro militar Elifas Chaves Gurgel também estariam cotados para compor o governo.

 O grupo liderado por Heleno se reúne três vezes por semana, a portas fechadas, em local que busca manter em segredo. “Não vai ter anúncio de ministério antes do segundo turno”, disse Heleno a ÉPOCA, enquanto aparava os cabelos em Brasília. “Tudo é especulação, chute. Quem está pensando nisso é o Jair Messias Bolsonaro. Ele é que diz quem vai, quem não vai, se vai ter, se não vai ter.” As reuniões, segundo Heleno, ocorrem para trazer assuntos a ser priorizados pelo governo. “Eu chefio o grupo”, disse. “Trabalhamos em assuntos que futuramente serão explorados por possíveis ministeriáveis. Saúde, Educação, Infraestrutura, Saneamento Básico, Meio Ambiente. A gente tem um grupo aqui que se reúne às vezes três vezes por semana, quatro vezes por semana, ouve especialistas nesses assuntos e está reunindo dados que poderão ser úteis mais tarde”, acrescenta. “Sou o (general) mais antigo e então acabo ficando de coordenador. A parte de defesa e segurança é minha.”

Questionado sobre se há um plano de governo, o general afirmou: “O programa de governo só acontece quando tem ministro. Não tendo ministro, não tem programa de governo. É um protocolo de intenções como aquele que foi entregue ao TSE. Esse protocolo de intenções pode ser ampliado, estudado e aprofundado durante quatro anos. Os assuntos são inesgotáveis. Quanto mais a gente estuda, mais a gente tem dúvidas”.Saber quais são as propostas específicas de Jair Bolsonaro para o país nas mais diversas áreas é tarefa difícil. Há orientações dentro da campanha para evitar o detalhamento das propostas a fim de evitar polêmicas. O general Aléssio Ribeiro Souto foi excessivamente cuidadoso ao explicar que é “apenas um colaborador” da área de educação e de ciência e tecnologia. Econômico nas palavras, disse que integra um time que se reúne quase diariamente para discutir “ideias básicas” que devem ser usadas pela equipe de transição e no plano de governo. “Aí sim se tornará uma coisa complexa bem elaborada, estruturada.” “Nós somos uma equipe técnica. Procuramos levantar as ideias básicas”, disse ele.

A única área de que ele aceita falar mais é a educação. As ideias básicas incluiriam, segundo o general, “valorização dos professores, motivação dos alunos, prevalência do mérito, revisão dos processos curriculares, atualização pedagógica, a correta aplicação dos recursos financeiros”. Souto disse que, se eleito, o governo Bolsonaro poderá mexer outra vez na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) do ensino médio, que começaria a ser implantada no ano que vem. “O ensino médico está em elaboração”, disse ele. “Se o governo pretende trabalhar para mudar a direção da gestão pública no Brasil, as coisas precisam ser revistas, atualizadas e melhoradas. Isso aí é fora de dúvida”, afirmou.

A dinâmica atual é convidar pesquisadores do país para proferir palestras para a equipe. “Trazemos algumas das maiores autoridades do país para poder dialogar conosco, debater, objetivando, primeiro, trazer ideias de pessoas que sejam muito talentosas e, segundo, que a gente obtenha um certo consenso em torno do que devam ser ideias básicas para serem utilizadas por uma equipe de transição para elaborar um plano de governo”, contou. “Nós só não entramos na área econômica.” Essa área é de Paulo Guedes, o Posto Ipiranga de Bolsonaro, como o próprio candidato apelidou. Todas as discussões são levadas ao general Heleno, a ponte com Bolsonaro e sua equipe.

Na terça-feira à noite, Bolsonaro disse que pretende cortar privilégios de servidores públicos e começar o governo estudando uma reforma da Previdência diferente da apresentada por Temer em novembro de 2017. Bolsonaro gravou entrevista à TV Bandeirantes na qual relativizou o discurso sobre privatizações. Se antes o discurso incluía mencionar “mais de 100” estatais passíveis de privatização, agora a ordem é anunciar que manterá sob o controle do Estado a geração de energia e o “miolo da Petrobras”. (Fonte: Época / Foto: Leo Martins-Agência O Globo)